O rabecão chegou. É assim que costumam chamar o carro do Instituto Médico Legal (IML) que carrega os cadáveres pelo Estado de São Paulo.
O rabecão chegou e trazia um bebê. De seis meses. Morto durante uma madrugada fria de inverno.
Os pais se aproximaram, avisando que a criança caiu do berço. O advogado da família apareceu ao mesmo tempo, exigindo que uma necropsia fosse realizada imediatamente.
“Esperto, o homem da lei tentava conseguir bons resultados para seus clientes”, disse o contador de histórias e diretor do IML, Ricardo Kirche Cristofi.
O homem sabia que a iluminação noturna dificulta a observação de alguns tipos de hematomas em cadáveres. “Mais esperto foi o médico, que imaginou o pensamento do advogado e proibiu, nesta exata palavra, o exame antes do Sol nascente.”
Somente às dez da manhã, foi iniciado o trabalho de tanatologia, palavra de origem grega que significa estudo da morte. “Com o encontro da luz natural da manhã com aquele pequeno corpo, o médico pôde ver que havia marcas quase imperceptíveis na pele do bebê”, conta Kirche.
As manchas indicavam um espancamento – hipótese confirmada no exame interno do corpo, realizado por um auxiliar de necropsia. O que pouca gente entende, segundo ressalta o diretor, é que a função do médico legista é não tocar no corpo.
“O auxiliar do exame é quem faz o corte principal, que vai do pescoço até a região pélvica, enquanto os médicos fazem as análises, observações e preparam os laudos.”
O exame foi concluído e o resultado foi entregue antes do fim do prazo. Depois de mais alguns dias de perícia que auxiliaram na investigação do crime, a Polícia Civil indicou o casal pela morte do bebê.
Ricardo Kirche conclui: “O menino havia sido agredido diversas vezes antes de morrer, com um traumatismo craniano.”